BN – Você participou da 1ª reunião do Conselho Nacional de Combate à Discriminação e Promoção dos Direitos de Lésbicas, Gays Bissexuais, Travestis, que aconteceu no final do mês de março, em Brasília. No encontro, você defendeu a união civil como a maior bandeira do movimento e não a luta contra a homofobia. Por que você acha que essa causa é mais importante?
JW – Eu acho que é a mais proveitosa batalha a ser travada porque eu sou a favor do direito penal mínimo, eu não acho que tudo tenha que virar caso de polícia. Eu acho que os crimes hediondos, os crimes contra a vida, esses sim têm que ser tratados pela polícia. Mas existe uma discriminação social que não vai ser combatida através da criminalização. É por isso que a discriminação tem que ser desconstruída culturalmente e socialmente, e a única maneira de fazer isso é lutar pela igualdade no acesso ao direito porque alguma discriminação social sempre vai haver como fundamento da própria pluralidade da sociedade. Se você é heterossexual e não quer frequentar clubes gays, e quer se reunir em clubes com pessoas iguais a você, é um direito seu. O direito a livre associação. Ok, mas esse direito implica em alguma discriminação: ‘Eu quero estar com os meus e não quero que os outros estejam ali’. Essa discriminação social pode haver, o que não pode haver é discriminação no acesso aos direitos. Ou seja, eu também devo ter direito à livre associação, eu também devo ter direito ao casamento civil, eu também devo ter direito à escola gratuita de qualidade. Ou seja, a batalha é pela igualdade no campo do direito. O pontapé inicial dessa batalha para estender, de fato, a cidadania aos homossexuais e garantir essa igualdade é o direito ao casamento civil, porque o casamento, ou seja, você se conjugar a alguém, tem a ver com o direito inalienável à vida e à felicidade. A felicidade do ser humano se constrói por meio do afeto e isso não pode ser negado à gente.
BN – Você já tinha um histórico de militância LGBT antes do Big Brother Brasil, mas você acredita que a sua passagem pelo programa contribuiu para aflorar essa atuação no campo político?
JW – Não, muito pelo contrário. Eu me tornei uma pessoa conhecida do grande público brasileiro através do reality show, porque o programa é um campeão de audiência, que interessa à ampla maioria da população brasileira que só tem como forma de entretenimento a televisão, que não tem dinheiro para ir ao teatro, o cinema é muito caro, não vai a exposições de artes, enfim. A grande maioria da população brasileira se entretém na TV e ao aparecer no reality show essa maioria ficou me conhecendo, mas a minha militância não aumentou nem diminuiu depois dali. Ela continuou a mesma, com a diferença que qualquer declaração minha virava uma declaração pública porque eu fui identificado ali no programa com essa causa para a grande maioria que desconhece o próprio movimento. Uma grande maioria que não conhecia o movimento LGBT, passou a prestar atenção por conta da minha presença ali, mas a minha relação com o movimento antecede muito o programa. Minha relação com o Grupo Gay da Bahia, por exemplo, com o Luiz Mott, com Marcelo Cerqueira, com a organização da Parada Gay, antecede muito o programa. Assim como a minha própria ligação com a defesa dos direitos humanos. Eu criei e coordenei por muitos anos o programa de pós-graduação lato sensu da Faculdade Jorge Amado em Jornalismo e Direitos Humanos. Eu trabalhei durante muito tempo na Organização do Auxílio Fraterno, coordenando o programa de educação pela mídia e para mídia com crianças em situação de risco. Eu criei o Núcleo de Mídia e Cidadania, junto com Amaranta César. Ou seja, o meu trabalho em defesa dos direitos humanos é um trabalho que antecede e muito a minha participação no Big Brother. E mesmo a minha atuação como jornalista e todos os prêmios que eu ganhei eram na atuação no campo dos direitos humanos.
BN – Então, sob esse ponto de vista, você acredita que a fama proporcionada pelo reality show deu maior visibilidade a questões que você já defendia antes?
JW – É, mas porque eu soube me conduzir. Eu entrei no programa tanto sabendo como iria me conduzir lá dentro, como saí do programa sabendo como iria me conduzir. Eu adoro o programa, acho um gênero de entretenimento muito bacana, mas entrei lá para tê-lo como objeto de estudo. Ele é meu objeto de estudo. Mas eu sabia como me conduzir depois. Quando uma parte da imprensa de entretenimento ficou obcecada com a ideia de que eu iria me bastar com esse papel de celebridade, eu simplesmente me retirei desse papel porque meu objetivo não era esse. Eu utilizei o programa para amplificar, digamos assim, as minhas batalhas e minha condição pública como jornalista, como professor e como escritor.
BN – Como você entende esse ponto de passagem, que para muitas pessoas pode ser contraditório, de um programa como o Big Brother Brasil para um partido socialista, de extrema esquerda, que é o PSol?
JW – Essa passagem só é contraditória para gente burra, ignorante e desinformada. E que não tem vontade sequer de se informar. Porque, se as pessoas fizessem uma consulta mínima sobre a minha vida que precede o Big Brother – porque o programa durou três meses e a minha vida até o programa durou 30 anos – se as pessoas se dispuserem no mínimo a resgatar a minha vida anterior ao programa, elas vão ver que não há incoerência nem contradição nenhuma em me filiar ao PSol. Muito pelo contrário, contradição seria se eu me filiasse ao DEM ou ao PSDB. As pessoas precisam deixar de ser preconceituosas e arrogantes. Isso é arrogância, você não se informar e emitir opiniões rasteiras sobre uma pessoa é arrogância. Tanto que quando as pessoas vêm falar pra mim “ah, eu estou surpreso com o seu mandato” ou “o seu mandato me surpreendeu”, eu digo “ah foi?. Porque eu não surpreendi nem a mim, nem a quem me conhece, nem aos meus alunos, nem aos meus amigos de jornalismo, nem a ninguém que conhece a minha posição, o meu temperamento e os valores que eu defendo. Pode ser para você que acha que a vida começa e termina em um reality show. Pode ser para você, cuja fonte de informação se resume à televisão e ao entretenimento televisivo”.
BN – Por que a sua preferência pelo PSol do Rio de Janeiro e não da Bahia?
JW – Por uma questão muito óbvia. Quando eu saí do reality show eu fiz um contrato com a Rede Globo e fui trabalhar como autor e roteirista da emissora. Com o trabalho, eu me mudei para o Rio de Janeiro e a cidade passou a ser a minha residência. Com essa mudança, em 2005, eu tive que mudar o meu domicílio eleitoral porque era aqui que eu ia votar. Não faria sentido eu morar no Rio e participar da política na Bahia. Eu não saberia nem em quem votar, e eu não sou o tipo de cidadão que despreza o próprio voto. Se eu voto em uma cidade, eu quero participar da vida política da cidade. Então, eu mudei o meu domicílio eleitoral em 2005 e no final de 2006 eu me filiei ao PSol, porque é o partido que eu tenho mais afinidade, tem menos vícios, está menos comprometido com acordos e coligações do que o PT. Por isso é o partido que eu tenho mais identificação programática e ideológica. Com isso não quer dizer que eu concorde com tudo do PSol. Aliás, no PSol nem todo mundo concorda e isso é muito bacana. Quando a Heloísa Helena soube da minha filiação, me convidou para ser candidato. Eu moro no Rio de Janeiro, meu domicílio eleitoral é no Rio, me filiei ao PSol do Rio, então não faria sentido eu sair para me candidatar pela Bahia. Até porque eu me candidatei a um cargo de deputado federal, que diz respeito à Federação, então as políticas que eu defendo e a minha atuação legislativa não diz respeito só ao Rio, embora eu seja muito grato aos eleitores do Rio e represente o Rio, mas vale para todo o país.
BN – No momento de filiação ao PSol, você chegou a cogitar a possibilidade de fazer isso na Bahia?
JW – Não, não cogitei.
BN – Você disse que há coisas no programa do PSol que você não concorda e que é bom que isso aconteça. Você pode dar um exemplo?
JW – Tem setores do partido que radicalizam, por exemplo, na ideia de revolução. Que vai haver um dia uma revolução, as massas vão tomar as estruturas de poder e promover o socialismo. Eu não acredito nisso. Aliás, a história nos mostra que isso não é mais possível e onde aconteceu não funcionou da maneira como a gente esperava. Então, eu sou um cara que defende justiça social dentro do sistema que a gente tem, investir naquilo que há de melhor no moderno capitalismo, que é a valorização do indivíduo e dos direitos humanos. Buscar na valorização do indivíduo a possibilidade de trabalhar o coletivo, que é a ideia de dignidade humana. Mas isso é uma coisa mais complexa, que não caberia explicar agora. Resumindo, eu acho que a gente tem que trabalhar pegando esses princípios nobres da modernidade e, a partir daí, proteger o coletivo. Porque a partir desses princípios a gente protege, por exemplo, o coletivo das minorias.
BN – Sobre suas pretensões políticas para o futuro, você pensa em ir além de deputado federal? Quais os seus planos daqui para frente?
JW – A única certeza que eu tenho é que eu não vou sair da luta pela defesa dos direitos humanos, da justiça social e das liberdades. Eu tenho certeza absoluta que isso vai me acompanhar pelo resto da minha vida. Agora, onde eu vou promover essa luta eu não sei: se é em um segundo mandato, se é no movimento social, se é na sala de aula ou se é nas três coisas ao mesmo tempo. Sobre isso eu não vou fazer exercício de futurologia. Eu entrei aqui para lutar por essa causa e não para garantir ou sustentar privilégios para mim. A minha ideia não é essa. A minha ideia é batalhar por essas causas e é isso que eu estou fazendo desde que eu entrei. Por isso, em tão pouco tempo, meu mandato se diferenciou, porque eu quero cumprir essa função. Se no futuro eu vou continuar nessa representação política institucional, ou se eu vou voltar para o movimento, isso eu não sei. O futuro a Deus pertence, como diz o dito popular.